OS FUNDADORES
No correr
destas viagens pela História voltamos, agora, às origens, ao tempo em que «tudo
começou». O que nos leva a considerar uma noção que não está muito divulgada
entre nós: a noção dos Fundadores. De facto, tendemos a considerar o primeiro
rei, D. Afonso Henriques, como o quase-único artesão da independência e, quando
muito, os seus pais, D. Henrique e D. Teresa, figuram como precursores, ponto
final. Mas a verdade é que houve todo um grupo de homens que, pela sua
importância social e militar, bem como pelas suas opções políticas, merecem
amplamente partilhar da categoria de Fundadores de Portugal.
Nesta crónica,
ocupar-me-ei de um só desses fundadores, um dos mais esquecidos e ausentes da
memória popular: trata-se de Paio (isto é: Pelágio ou Pelayo…) Mendes, que foi
arcebispo de Braga entre 1118 e 1137.
Segundo uma
tradição histórica muito aceite, embora não totalmente comprovada, D. Paio
Mendes pertencia à poderosa casa da Maia e era irmão de dois outros fundadores:
Soeiro Mendes da Maia e Gonçalo Mendes da Maia, que ficou conhecido como «o
Lidador». Para o caso que nos ocupa, não é importante saber se pertencia à casa
da Maia ou à casa de Sousa; o que importa é o apoio que deu a D. Afonso
Henriques e a provável influência que exerceu junto do infante — aliás, o Prof.
Torcato Sousa Soares defendeu como hipótese quase certa que foi Paio Mendes, e
não Egas Moniz, o aio de Afonso Henriques, hipótese que justificou com
argumentos bastante convincentes.
De qualquer
modo, o certo é que a acção deste homem se revelou decisiva em dois aspectos,
sendo que o primeiro foi a sua luta constante contra Diogo Gelmires, arcebispo
de Compostela. De facto, pode-se dizer que a luta pela emancipação da terra
portucalense, foi (não só mas também) o verdadeiro duelo travado entre
Compostela e Braga no campo da organização eclesiástica, da disputa pelas sés
sufragâneas de cada arquidiocese. Dada a importância da Igreja, um tal conflito
não podia deixar de ter reflexos políticos, mesmo porque os arcebispos também eram
potentados militares. Ora, a verdade é que D. Paio Mendes mostrou-se
particularmente dinâmico na defesa de Braga contra as investidas de Compostela.
O segundo
aspecto foi, como referido acima, a adesão do arcebispo ao movimento
autonomista de Afonso Henriques — e talvez mesmo que, em lugar de «adesão», se
deva dizer «inspiração». Note-se que, quando D. Teresa, que se travou de razões
com Paio Mendes, o exilou, este foi para Zamora — e levou consigo o jovem
infante portucalense. Pois bem: como é sabido, foi justamente nessa ocasião, em
Zamora, que Afonso Henriques se armou a si próprio cavaleiro, o que
correspondia a dar um passo simbólico na direcção de uma coroa real, pois só os
reis se armavam cavaleiros a si mesmos. E D. Paio Mendes estava presente; é
difícil não pensar que aquele acto político se deve à sua influência, mais até
do que à única iniciativa do então muito jovem infante.
Foi isto em
1122 ou 1125. E em 1128 travava-se a batalha de São Mamede, que deu o poder a
Afonso Henriques. Ao lado do infante, estavam Egas Moniz, estavam os Sousas,
estavam os da Maia — estava D. Paio Mendes, muito possivelmente, um dos grandes
promotores da revolta contra D. Teresa e a «facção galega».
Sem dúvida que,
na nossa Galeria dos Fundadores, temos de incluir este quase esquecido
arcebispo de Braga.
João
Aguiar
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